A grave crise climática que atravessamos apela a uma transição urgente para fontes de energia renováveis, como a eólica. Com uma vasta extensão costeira, Portugal decidiu apostar fortemente no desenvolvimento de parques eólicos marinhos, ou offshore. São ainda muito poucas as turbinas eólicas marinhas no nosso país, mas prevê-se uma enorme expansão nos próximos anos. O primeiro passo para essa expansão foi dado recentemente pelo governo, ao propor um conjunto de áreas prioritárias para o desenvolvimento de novos parques eólicos offshore na nossa costa continental.
A produção de energia eólica em ambiente marinho acarreta, no entanto, impactos significativos na biodiversidade, em particular nas aves (figura 1). Entre os efeitos negativos mais conhecidos dos parques eólicos encontram-se: 1) a mortalidade direta por colisão com os aerogeradores, 2) a perda de áreas significativas de habitat de alimentação e 3) a interferência nos movimentos migratórios, uma vez que os parques eólicos podem representar uma barreira ao voo das aves. Importa realçar que as aves marinhas são um dos grupos mais ameaçados de extinção a nível global, com cerca de um terço das espécies classificadas como “vulneráveis”, “em perigo” ou “criticamente em perigo” na lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza.
Portugal alberga várias dezenas de espécies de aves marinhas e costeiras, algumas das quais de estatuto de conservação desfavorável. Para além das espécies que nidificam em Portugal, várias dezenas de outras espécies ocorrem na nossa costa e/ou sobrevoam as nossas águas durante as suas migrações, algumas delas ficando por vários meses de inverno, outras atravessando de e para zonas de invernada mais a sul. Destacam-se, pela sua abundância na nossa costa, em alguns casos valores de importância mundial, espécies como o Alcatraz Morus bassanus, a Pardela-balear Puffinus mauretanicus (criticamente ameaçada de extinção), a Negrola Melanitta nigra, o Garajau-de-bico-preto Thalasseus sandvicensis e o Alcaide Catharacta skua.
Considerando o frágil estatuto de conservação e a importância da nossa costa durante várias fases do ciclo de vida das aves marinhas, é fundamental minimizar o risco que novas infraestruturas eólicas possam vir a ter para a sua sobrevivência nos nossos mares. Para tal, torna-se imperativo a realização de uma avaliação ambiental estratégica à localização de novas infraestruturas eólicas offshore, a qual deve ser informada por estudos detalhados sobre os movimentos e a distribuição das várias espécies.
Em resposta à divulgação do relatório do governo com as áreas propostas para desenvolvimento de energia eólica offshore (figura 1), investigadores do cE3c, em colaboração com colegas do CESAM e do MARE, contribuíram para a discussão pública sobre este assunto, efetuando uma análise preliminar dos dados atualmente disponíveis e listando um conjunto de recomendações a fim de evitar e minimizar o impacto de novas infraestruturas nas aves marinhas. Destas, destacam-se 1) a importância da definição de linhas orientadoras para a elaboração dos processos de avaliação ambiental dos projetos a serem submetidos; 2) a importância da quantificação dos impactos cumulativos dos vários parques eólicos offshore existentes ao longo das rotas migratórias das aves marinhas e 3) a importância do cumprimento de legislação e acordos internacionais, evitando a implementação de parques eólicos dentro de Zonas de Proteção Especial para as Aves (figura 2) e em outras zonas de importância reconhecida (e.g. Important Bird Areas, corredores de passagem migratória situados perto da costa).
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30 Jun 2023