Em memória da brilhante investigadora que agora nos deixou, lembramos não apenas sua vasta contribuição para a ciência, mas também sua paixão incansável pelo conhecimento e sua dedicação inabalável ao avanço dos estudos com Térmitas em Portugal Continental e Açores. Sua partida deixa um vazio na comunidade científica, mas seu legado perdurará como inspiração para as gerações futuras de entomólogos em Portugal.
Lina Nunes formou-se em Biologia (1987) pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Fez o seu doutoramento em Biologia/Tecnologia da Madeira (1997) pelo Imperial College London, Reino Unido. Era Investigadora Principal no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) em Lisboa, Portugal, onde coordenava a Unidade de Prevenção de Biodeterioração do LNEC. Foi colaboradora do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (cE3c) no grupo IERS. Dedicava a sua atividade científica e técnica a atividades de I&D&I principalmente relacionadas com a durabilidade e proteção da madeira e de outros materiais de base biológica na construção.
A Lina tinha sempre imensas ideias para um trabalho pequeno ou um grande projeto, fruto das diversas redes colaborativas que fazia questão de integrar, sendo o International Research Group on Wood Protection o mais importante de todos, que a acompanhou em toda a sua carreira (desde que ganhou o Ron Cockford Award em 1991, que lhe permitiu estar presente na reunião do grupo no Japão) e fortalecer então a rede de colaboração e de amizades, que futuramente lhe iria proporcionar colaborações por toda a Europa e no mundo inteiro. Nos últimos anos, esteve envolvida num número crescente de estudos sobre a biodegradabilidade de materiais de construção, incluindo modelos de biodeterioração. Publicou mais de 86 artigos em revistas científicas indexadas, 19 capítulos de livros e mais de 100 trabalhos em atas de conferências, interagindo com um grande número de colegas nacionais e internacionais (cerca de 400). Orientou ou co-orientou 9 teses de doutoramento e 9 teses de mestrado.
A Lina era a especialista em biologia e controlo de térmitas em Portugal, e a nível mundial ombreava com os melhores. Claro que também era especialista conceituada noutros campos da biodeterioração e proteção de madeiras e outros materiais de origem natural, no entanto, a sua paixão eram as térmitas. Começava sempre as aulas para que era convidada em diversas universidades a dizer que gostava muito de térmitas, e que são insetos muito importantes na floresta. O problema é que quando interferem com as estruturas, temos mesmo de agir, e dificilmente conhecerão alguém que seja mais informado e pragmático do que a Lina a avaliar e aconselhar neste campo. Teve vários alunos de doutoramento, mas sabemos que quem trabalhava o tema das térmitas tinha sempre o seu carinho especial, e graças a todo o seu trabalho e orientação, foi possível, por exemplo, identificar que a espécie de térmita subterrânea em Portugal Continental é a Reticulitermes grassei (e que está também presente na Horta, Faial, Açores).
Implementou diversas técnicas de estudo de térmitas subterrâneas e seu controlo, como a estratégia de mark-release recapture para delimitar colónias, a avaliação de diversos tipos de armadilhas no solo, e a investigação sobre o efeito de diversas substâncias químicas ou naturais nas térmitas, bem como a avaliação da suscetibilidade de inúmeros materiais (madeiras, derivados e outros materiais de origem natural) à ação das térmitas.
Na sua colaboração com a Universidade dos Açores teve um papel importante no estudo da biologia da térmita de madeira seca Cryptotermes brevis assim como na definição de estratégias de gestão desta importante praga urbana. Também importante foi o seu envolvimento no processo de tentativa de erradicação da térmita subterrânea Reticulitermes flavipes na ilha Terceira.
Outro tema que desenvolveu foi o estudo dos simbiontes que colaboram com as térmitas de forma a digerir a madeira de que se alimentam – os protistas flagelados, que existem apenas no intestino das térmitas. Se se lembram da teoria endossimbionte, lembram-se da Lynn Margulis, que idealizou essa teoria depois de trabalhar com os simbiontes das térmitas. Cada vez que víamos estes simbiontes ao microscópio era como uma explosão de vida debaixo dos nossos olhos (como é que tantos seres vivos, tão diferentes, conseguem viver dentro de um intestino de uma térmita?).
Na nossa opinião a Lina também era assim, não passava despercebida, gostava de viver e era uma alegria vê-la a rir, contagiava todos à sua volta. Deixa muitas saudades, e um grande vazio.
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