Menos reconhecida que as alterações climáticas, a crise da biodiversidade é provavelmente o maior problema ambiental da atualidade, desde logo porque dela dependem todos os processos ecológicos que permitem a nossa vida na terra: da produção de alimentos, à composição do ar que respiramos e da boa qualidade da água, à produtividade dos solos, para citar apenas alguns exemplos. Menos emblemáticos do que os linces ibéricos ou as águias reais, os insetos são também vítimas silenciosas da atual crise de extinção em massa e precisam de ser monitorizados e conservados.
Apreciadas por crianças e adultos, as borboletas são os mais carismáticos dos insetos. Além de bonitas são excelentes bioindicadores, isto é, conhecer a sua diversidade e abundância permite-nos estimar a diversidade e a abundância de outros insetos menos conhecidos e mais difíceis de monitorizar. Certificam ainda a boa saúde dos habitats onde ocorrem e, porque respondem com rapidez às mudanças ambientais, informam sobre a adequação de práticas e medidas de gestão e conservação do território. A monitorização das comunidades de borboletas é realizada regularmente em vários países europeus por milhares de cidadãos, como parte do Plano Europeu de Monitorização de Borboletas Diurnas. Portugal juntou-se a este plano em 2019 com o projeto Censos de Borboletas de Portugal que consiste na contagem regular do número de indivíduos de cada espécie destes insetos que podem ser observados ao longo de percursos fixos, chamados transectos. Esta metodologia usada por toda a Europa possibilita o cálculo índices, a realização de comparações entre diferentes sítios e a avaliação das tendências populacionais das borboletas e dos insetos.
Em Portugal Continental são já 61 os transectos a serem monitorizados por quase uma centena de pessoas. Além de vários cientistas-cidadãos que participam de forma particular, também algumas organizações não governamentais de ambiente, entidades municipais e estatais aceitaram o desafio de se juntar aos Censos, entre elas o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), que assegura a monitorização em 18 Áreas Protegidas ou Classificadas de Portugal Continental. Entre 2019 e 2022, foram contados 43.841 indivíduos pertencentes a 102 espécies (75% das espécies de borboletas diurnas que ocorrem no nosso país) nos transectos monitorizados de norte a sul do país. Embora ainda seja cedo para retirar conclusões sobre o estado de conservação das borboletas portuguesas e dos seus habitats, já se pode adiantar quais as espécies mais abundantes ou indicar os transectos com maior diversidade de borboletas.
É para apresentar e debater estes e outros resultados que se vão reunir em Avis, neste primeiro encontro presencial desde do lançamento, cientistas-cidadãos, vigilantes da natureza e representantes de várias instituições, contando o programa com a apresentação dos projetos homólogos a nível europeu e do país vizinho, bem como, de outros projetos de ciência-cidadã que têm os insetos como protagonistas e das perspetivas de diferentes setores relacionados com a conservação da biodiversidade.
Como não podia deixar de ser, há também espaço para atividades abertas ao público, com a observação de borboletas noturnas na primeira noite e um workshop de identificação de borboletas na manhã de domingo, possibilitando que mais pessoas se juntem a este projeto de ciência-cidadã, que já conquistou a Europa, e está agora em plena expansão no nosso país.
A iniciativa resulta de uma parceria entre o cE3c, o TAGIS, a European Butterfly Monitoring Scheme e a Butterfly Conservation Europe. Conta com o financiamento da Altri e do Projeto Europeu SPRING, e com o apoio do Município de Avis, Junta de Freguesia de Avis e do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas.
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